Qual a responsabilidade de um professor de teologia sobre os erros de seus alunos? Descubra os limites bíblicos do ensino e da consciência cristã.
Introdução
O ensino teológico é uma missão sagrada. O professor de teologia não forma apenas intelectos; ele forma consciências, molda vocações e impacta eternidades.
A responsabilidade diante de Deus é grande, mas também precisa ser bem delimitada para não se tornar um peso injusto.
Recentemente, um caso envolvendo o pastor e professor Elizeu Rodrigues gerou debates sobre até onde vai a responsabilidade de quem ensina teologia.
A pergunta é pertinente, atual e exige uma resposta baseada nas Escrituras e no discernimento pastoral.
Neste artigo, refletiremos biblicamente, pastoralmente e teologicamente sobre os limites e alcances da responsabilidade de um professor de teologia diante das atitudes de seus alunos.
1. O dever sagrado do ensino
Ensinar a Palavra de Deus não é uma tarefa qualquer. Tiago adverte:
“Meus irmãos, não sejam muitos de vocês mestres, sabendo que seremos julgados com mais rigor.” (Tiago 3.1 - NAA)
Isso mostra que o ensino da Palavra tem peso eterno. O professor de teologia é, por assim dizer, um "mestre do Reino" (Mt 13.52), chamado a:
Explicar com fidelidade o texto sagrado (2Tm 2.15)
Ensinar a sã doutrina (Tt 2.1)
Formar servos aptos para toda boa obra (2Tm 3.16-17)
Esse ensino deve ser acompanhado por uma vida coerente, como Paulo recomendava a Tito:
"Seja um exemplo para os fiéis no modo de viver, na integridade, na reverência, na linguagem sadia..." (Tito 2.7-8)
Portanto, o professor é responsável por:
Ensinar corretamente
Viver de forma coerente com o ensino
Corrigir erros com firmeza e amor (2Tm 4.2)
Mas é também importante entender: a responsabilidade do professor é formar, não controlar.
2. O limite da responsabilidade: a liberdade do aluno
Nem Jesus foi seguido fielmente por todos os que ensinou. Tendo vivido e ensinado com perfeição, ainda assim foi traído por Judas, negado por Pedro e abandonado pela maioria na hora da cruz.
Isso nos ensina que o discípulo tem liberdade. O professor pode influenciar, mas não pode decidir por ele.
Cada crente é responsável diante de Deus pelas suas próprias escolhas.
“Cada um de nós dará conta de si mesmo a Deus.” (Romanos 14.12)
Quando um aluno é ensinado na verdade, mas escolhe se desviar dela, ele está rejeitando não o professor, mas o Senhor que o chamou.
Paulo enfrentou isso em seu ministério:
“Demas me abandonou, tendo amado o presente século.” (2Tm 4.10)
Demas era companheiro de Paulo. Andou com ele, ouviu suas pregações, viu milagres. Mas decidiu amar o mundo.
A responsabilidade foi de Paulo? Claro que não. Cada um é dono de suas escolhas.
3. O professor deve corrigir, mas não se responsabilizar pelo pecado alheio
Quando um aluno ensinado por um professor público comete erros, o que o professor deve fazer?
Corrigir. Alertar. Admoestar.
Mas ele não deve se sentir culpado se o aluno persiste no erro, mesmo após advertências.
Foi isso que o Pr. Elizeu Rodrigues fez ao escrever:
"Não sou pastor do Miguel. Não sou pai do Miguel. Sou professor de teologia. Ensino o que sei, o que prego e o que vivo. Mostro a ele seus erros e o corrijo à luz da Palavra."
Ou seja: ele cumpre o papel de mestre. Ensina, exorta, orienta. Mas quem decide é o aluno.
4. Uma analogia pastoral: o médico e o paciente
Imagine um médico que ensina ao paciente sobre a gravidade do tabagismo. Ele mostra exames, apresenta estudos, recomenda tratamento.
Mas o paciente, mesmo com todas as informações, continua fumando.
Será culpa do médico se ele adoecer?
Assim é com o professor de teologia. Ele pode e deve ensinar com zelo, mas não pode viver a vida do aluno por ele. O aluno também tem responsabilidade pessoal, moral e espiritual.
5. Quando o professor se omite, sim, ele peca
Por outro lado, se um professor vê um erro grave, um ensino distorcido, um comportamento que escandaliza, e se cala por medo, omissão ou conveniência, ele se torna cómplice.
“Se você não os advertir... eu cobraria o sangue deles de suas mãos” (Ez 33.6)
A responsabilidade do professor é advertir com amor e firmeza.
Não é se justificar, mas se posicionar com clareza.
Elizeu fez isso com sabedoria. Ao declarar que ensinou, advertiu e corrigiu seu aluno, ele se posicionou publicamente e protegeu seu ministério.
6. Exemplos bíblicos: quando o discipulado não funcionou como esperado
a) Judas Iscariotes
Judas foi discipulado por Jesus. Ouviu o Sermão do Monte, viu os milagres, participou da Ceia.
Mesmo assim, traiu o Mestre por 30 moedas de prata. Não por falta de ensino, mas por corrupção interior.
b) Os filhos de Eli
Eli era sacerdote, mas seus filhos eram impuros e irreverentes. Ele foi responsabilizado porque sabia dos pecados deles e não os repreendeu com rigor (1Sm 3.13).
O problema aqui não foi o erro dos filhos, mas a omissão do pai-professor.
c) Paulo e Alexandre, o latoeiro
Paulo cita Alexandre como opositor do Evangelho (2Tm 4.14). Ele era provavelmente alguém próximo, talvez até membro de igrejas plantadas por Paulo.
Mas a responsabilidade do apóstolo era proclamar e corrigir. Alexandre responderia por suas escolhas.
7. Quando o erro do aluno pode afetar o ministério do professor?
A responsabilidade do professor é pessoal. Mas, em alguns casos, se houver conivência, apatia ou silêncio, o nome do professor pode ser associado ao erro.
Por isso, é importante:
Deixar claro o distanciamento do erro
Reafirmar os princípios ensinados
Advertir com amor, mas com firmeza
Orar pela restauração do aluno
8. Conclusão: ensinar, corrigir, confiar
O professor de teologia não pode assumir a responsabilidade pelas escolhas alheias. Sua missão é:
Ensinar a Palavra com fidelidade
Corrigir o erro com humildade e coragem
Testemunhar com integridade
Confiar que o Espírito Santo há de completar a obra
Como disse Paulo:
“Eu plantei, Apolo regou, mas o crescimento veio de Deus.” (1Co 3.6)
Se o professor plantou bem, e corrigiu quando foi necessário, não pode ser responsabilizado pela desobediência do coração alheio.
A responsabilidade de quem ensina termina onde começa a consciência de quem aprende.
Referências Bibliográficas:
Bíblia Sagrada, Versão Nova Almeida Atualizada (SBB)
CULLMANN, Oscar. Pedro, Discípulo, Apóstolo, Mártir. ASTE, 1964.
DUNN, James D.G. Unidade e Diversidade no Novo Testamento. Academia Cristã, 2009.
HASSEL, Gerhard F. Teologia do Antigo Testamento. Ed. Vida Nova, 1991.
VOS, Geerhardus. Teologia Bíblica do Antigo e Novo Testamento. Cultura Cristã, 2010.
Chamada final
Ensine com zelo. Viva com temor. Corrija com coragem. E descanse: O fruto pertence ao Senhor.
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